quinta-feira, 13 de março de 2014

Meu Lugar

Sempre precisei achar um lugar no mundo para conseguir me conectar com a vida.
Pequena ainda no telhado comendo pitanga, longe do chão, mais perto do infinito, entre uma frutinha e outra encontrava meu silêncio. Achava naquele lugar um tempo sem minutos, um céu infinito, uma presença de preencher qualquer poço vazio.
Ainda pequena quando não haviam motivos frutíferos para estar lá em cima, sentava na minha janela quando todos dormiam. Via uma cidade piscante, faróis de carro e sinais a trocar de cores naquele breu. Na minha visão apenas um corredor entre as casas para encontrar as cores noturnas. Naquele silêncio esplendido, de luzes a brilhar, minha alma conversava comigo, dizia coisas que acalmavam meu coração infantil, que tinha medo de crescer.
O tempo foi passando e minha vida foi crescendo. Crescendo de falta de tempo, crescendo de lugares para ir, mas sem nenhum destino para chegar e contemplar a minha alma.
E onde eu fui parar?
Não sei onde eu fui, sei que precisei caminhar por entre as sombras que eu mesma construí, pular barreiras que eu mesma levantei, tirar as pedras que eu mesma permiti que me atirassem.
Nesse terror noturno interno, sem farol para me guiar, sem luz e céu para me orientar, nessa falta de ar forcei meus pulmões e passei a destampar meus poros e consumir novamente a minha própria energia, água, ar, pureza, luz.
Essa luz iluminou o meu lugar fez eu entender que esse meu lugar é sutil, e de muito mais estado de ser do que de tato.
 E quando me peguei de novo nas mãos descobri esse enorme universo.
De pés descalços, ar puro nos pulmões, lua ou sol tanto faz, o meu lugar é uma árvore hoje, uma gramado ainda gelado da chuva do dia anterior. Os passos trocados até a padaria, a minha cama iluminada por uma vela do meu altar, vidraça cintilante da garoa também são meus lugares.
O sol da manhã bem leve aquecendo minhas mãos enquanto eu dirijo. Pés colados sentido o outro corpo a pulsar, respiração compassada, tintas espalhadas a meia luz e alma espelhada no papel, também são meus lugares.
Meu lugar é tão próximo a Unidade que transbordo por dentro e desprezo aquilo que pouco causa, que não transmite, que não transparece.
Simplicidade toca, toca a alma!


Aline Barcelos 
2014

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